Pensar a atualidade significa dar conta das transformações históricas, sociais, culturais, econômicas e ambientais que permeiam a sociedade capitalista. A construção dessa sociedade deu-se com base em valores de produção e consumo exacerbados, que desafiaram os limites de suporte dos recursos naturais do planeta, levando a um estágio de extrema desigualdade, pobreza e degradação ambiental. Essas consequências negativas, claro, foram acompanhadas por conquistas tecnológicas e científicas importantes para a evolução intelectual e física do ser humano.
No entanto, essas benesses estão, inequívoca e injustamente, mal distribuídas a uma pequena parcela da população mundial, quando 80% convivem com o lixo e esgotos a céu aberto, com a escassez de água, a fome, a violência, o analfabetismo, o desemprego entre tantos outros problemas sociais e ambientais. Enquanto os países mais ricos respondem pela maior parte do consumo de recursos naturais e maior produção de dejetos que degradam o meio ambiente, a maioria da população mundial não tem suas necessidades básicas atendidas, tendo um padrão de consumo abaixo do nível de subsistência e um acesso limitado aos recursos e serviços (VARGAS; RIBEIRO, p. 26, 2001).
É importante perceber que os problemas ambientais não existem porque toda população do planeta mantém uma qualidade de vida elevada, em que todas as pessoas têm acesso à saúde, moradia, educação, emprego, lazer, meio ambiente, um padrão de consumo alto. Eles se agravam porque a gestão dos recursos econômicos e naturais está concentrada em poucos grupos poderosos, sob o domínio de um sistema que a conduz a partir de uma perspectiva de pensamento antropocêntrica e fragmentária, em que o homem e a natureza são elementos dicotômicos; em que essa é vista como propriedade daquele, à disposição, de forma apenas utilitarista, para satisfazer necessidades e superfluidades.
A nossa sociedade, baseada em valores individualistas, utilitaristas e consumistas, está atualmente diante de um cenário social e ambiental desafiador, em que pese os problemas causados, durante séculos, pelos ditames do sistema econômico capitalista. O desafio está na transformação da atual sociedade em uma sociedade sustentável, baseada em valores universais, no equilíbrio social, ambiental e econômico, na diversidade, no respeito, na democracia e na solidariedade. Essa transformação deve ocorrer dentro de uma reflexão ética, ou seja, um pensamento crítico diante de uma realidade de aviltamento do ser humano e do meio ambiente à face da materialidade, da imposição do ter sobre o ser.
A Educação Ambiental crítica surge com a proposta de, não só, romper com o paradigma da destruição dos recursos naturais, da diversidade cultural e biológica e do ser humano reflexivo, mas de “contribuir para uma mudança de valores e atitudes, formando um sujeito ecológico capaz de identificar e problematizar as questões socioambientais e agir sobre elas” (CARVALHO, p. 156-157, 2006).
A capacidade de transformação do sujeito ético se apóia na transposição da única visão da verdade (im-)posta, a partir da percepção de si mesmo, do outro e do mundo na busca dos muitos sentidos que a complexa realidade lhe permite compreender. A superação de valores morais arraigados na sociedade que reproduzem comportamentos que agravam a desigualdade e a exclusão social e ambiental se faz possível diante de uma postura ética de crítica à ordem social vigente. Nesse sentido, é imprescindível que a compreensão, a reflexão e a criticidade acerca da realidade dominante e das possíveis realidades sejam um constante no movimento de transformação individual e coletivo, em nível local e planetário.
A educação, portanto, deve ir além de uma formação técnica e fragmentada, em que o indivíduo obtenha conhecimentos visando ao mercado de trabalho, sem ter consigo e com o outro uma postura ética e política diante dos sentidos da realidade. Ou seja, a educação deve desenvolver e estimular a virtude intrínseca do ser humano de fazer escolhas, tomar decisões e assumir responsabilidades, considerando o contexto histórico no qual está inserido, permeado ainda pelos múltiplos sentidos sociais e culturais da (sua) realidade.
Para a formação de sujeitos éticos, faz-se necessária uma educação crítica cujos objetivos são a emancipação e a liberdade (MARIN, 2004). A imposição de regras, normas e hábitos e o seu reconhecimento contribuem para o reforço das estruturas de poder, a reprodução e a naturalização de uma sociedade desigual e individualista. O posicionamento crítico acerca da sujeição a esse sistema rígido, à manutenção do status quo, exige novas formas de pensar a relação do homem com o mundo a propósito de reconstruí-la, permanentemente. O sujeito ético tem, portanto, a condição e a virtude de pensar criticamente a realidade posta e seus valores engessados e, principalmente, transformá-los em relações mais harmônicas, menos conflituosas e desiguais, visando à construção de um mundo baseado em valores éticos, como o respeito à liberdade e à justiça, a integridade humana e a solidariedade social.
A Educação Ambiental tem como base o pensamento crítico-reflexivo e as ações transformadoras dos valores vigentes, num processo interventivo contínuo. Deve, portanto, contribuir para o despertar de uma ética intrínseca ao ser humano, visto que se propõe a refletir sobre a relação do homem com o mundo, numa perspectiva holística.
Referências Bibliográficas:
CARVALHO, Isabel Cristina de Moura. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. 2ª edição. São Paulo: Cortez, 2006.
MARIN, Andréa Aparecida. Ética, Moralidade e Educação Ambiental. Interciencia - Revista de Ciência e Tecnologia da América. Março, vol. 29, n. 003, p. 153/157. Asociación Interciencia. Caracas, Venezuela. 2004. Disponível em: http://redalyc.uaemex.mx/pdf/339/33909007.pdf.
RIBEIRO, Helena; VARGAS, Heliana Comin (Orgs.). Novos instrumentos de Gestão Ambiental Urbana. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001.
Por: Naisa Carla Martins Santos
Nenhum comentário:
Postar um comentário